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CAÇA A UIVO

  Te esperei por tanto tempo que, agora, desistir é impossível.

  I

  Allenda puxou o ar bem devagar, como se assim pudesse reavivar e sentir novamente todas as suas lembran?as, de quando sua m?e ainda vivia e passeava com ela por aqueles lados. Os olhos pousaram numa pedra onde se sentavam, e na árvore onde ficavam apreciando os horizontes dos galhos mais altos. Sua m?e era uma manira, e adorava lhe ensinar os seus modos e os da sua gente, como seu pai lhe ensinava as coisas dos curupiras.

  Allenda voltou os olhos saudosos para o vale que descia, cavado pelo córrego que cantava suave enquanto descia. Com satisfa??o viu que pouca coisa havia mudado.

  As árvores eram altas e espigadas, criando um lugar de segredos. Apesar do longo tempo decorrido desde que estivera ali ainda conseguia se lembrar de muita coisa, e aquela ravina e o vale que se abria logo à frente faziam parte delas.

  Allenda olhou para a frente, para o vale que descia. As árvores eram altas, e um pequeno córrego corria na calha da ravina. Apesar do longo tempo decorrido desde que estivera ali, ainda conseguia se lembrar de muita coisa, e aquela ravina, e o vale que se abria logo a frente era um deles.

  Subitamente, Allenda saiu de suas cismas ao sentir algo sutil. Meio distraída deixou parte de sua aten??o se interessar por isso, até que o aumento da sensa??o a obrigou a colocar cada vez mais parcela de cuidados naquilo. De repente ficou totalmente atenta. Seu corpo ficou tenso e se p?s a seguir a energia de confronto que crescia de intensidade.

  Praticamente ela e ArrancaToco perceberam ao mesmo tempo os que avan?avam. Os sentidos ficaram em alerta, os músculos preparados, vindo de alguma distancia pela direita.

  Prestando aten??o conferiu que seis seres progrediam em sua dire??o, sendo que cinco deles estavam unidos, e pelos modos que andavam pareciam que procuravam um bom lugar para se aproximar do sexto, que vinha solitário.

  Allenda já vira isso muitas vezes.

  Devagar foi na dire??o dos seres, ao notar que os que pareciam ca?ar o que vinha sozinho aumentavam a passada. Sabia que eles estavam entrando no vale, vários metros abaixo de onde estava, por terem entendido que aquele seria um bom lugar para o confronto.

  Apressou o passo, tendo o cuidado, ela e ArrancaToco, de se manterem os mais silenciosos que pudessem.

  Quando chegou num local um pouco à frente do ser que subia sozinho, viu que tudo iria acontecer naquele lugar.

  Eleva??es baixas e suaves, árvores altas e esparsas, sombras, um regato; um bom local para uma batalha.

  Apurou os sentidos, conferindo que eles ainda iriam demorar alguns minutos para surgirem. Após conferir que estava contra o vento, depressa se ocultou em um pequeno monte no meio do mato, junto ao tronco de uma paineira. Ficaram em silêncio, aguardando, sondando o lugar, ouvindo passos sorrateiros, sussurros dos quais só o ar era íntimo.

  ArrancaToco se mostrou alerta assim que o primeiro, o que andava isolado, surgiu abaixo no morro.

  De súbito ela o reconheceu, e viu que ele n?o estava poderado. Era Uivo que subia sozinho pela trilha, com quem se estranhara na trilha, no dia anterior. Ele subia tranquilo o morro, distraído, parecendo pensativo.

  Mas havia algo em seus modos, uma ginga de guerreiro, que a alertou de que ele sabia o que estava acontecendo ao seu lado, que ele estava atento.

  Allenda o olhou curiosa. Sua intui??o a alertava sobre ele, apesar da boa impress?o que seu pai tinha dele. Havia algo nele, algo que n?o conseguia definir direito, como uma perigosa independência, que a deixava de sobreaviso.

  Com um sorriso satisfeito conferiu que os ferimentos que causara nele no encontro anterior já tinham cicatrizados, tanto no ombro quanto na coxa, cismou enquanto passava os dedos, distraída, pelo ferimento que ele causara com sua garra branca. Apesar de ter se sentido um pouco culpada pelo modo arrogante com que o tratara, e o atacara, coisa que até mesmo ela estranhara como sua atitude, acabou sorrindo, dizendo que era o que ele merecia.

  Com cuidado para n?o ser vista ficou observando Uivo tomar uma trilha mais sinuosa em dire??o ao córrego na cava do vale. Esperava algo comum, mesmo ao ver os outros irem progredindo silenciosos, perigosamente se acercando dele.

  Allenda sorriu.

  Dos cinco, dois vinham mais para os lados do caminho que Uivo seguia. Ela os avaliou com aten??o. Esses n?o eram estranhos e diferentes como Uivo; esses eram dois puros lobisomens. Ent?o observou o terceiro, que se mostrou um curioso caso de nefelin anhangá, mais distante pela retaguarda, de onde deveria se fechar. O quarto ser, o mais próximo de Uivo, era um sedenerá magrelo de modos ariscos e arrogantes. Ent?o se fixou no último ser, e viu que era uma nefelin manira-ellos, de modos ágeis e perigosos que, após se adiantar em rela??o a todos, sacara algumas flechas e aguardava a progress?o do grupo.

  Allenda pensou em ir embora, mas acabou ficando, curiosa em ver que tipo de guerreiro Uivo seria.

  - Só interferirei a seu favor, puminha, se eu ver valor em você – sussurrou para si mesma, decidindo-se como procederia.

  Com um sinal mandou ArrancaToco se afastar para longe, logo saltando para cima da paineira, após confirmar que ainda tinha o vento contra si, e que de um de seus galhos teria uma vis?o completa do teatro. Ela se ajeitou quando os sinais de ataque ficaram latentes.

  Como se fosse uma pe?a viu quando os dois lobisomens e o anhangá dispararam para cima dele.

  Allenda viu o aprendiz do humano Tenebe, com um urro poderoso que morreu em ecos pelo interior da floresta, se poderar numa velocidade incrível. Ele parecia uma on?a parda. Nas suas andan?as para o noroeste já vira algumas on?as como aquela, e até pessoas que o lembravam, mas eram menores e as linhas do rosto n?o eram t?o humanizadas. Esse era uma mistura de um puma com algo parecido com aquelas on?as, mas era bem mais portentoso, maior e de aspecto bem mais nobre. Curiosa ao máximo se aconchegou melhor no galho, n?o querendo perder nada do embate.

  Uivo rosnou alto e ficou como que parado, as longas garras curvas desembainhadas, os músculos pronunciados. Assim que o primeiro ficou ao alcance Uivo apenas se abaixou e girou. Um dos lobisomens ainda caia todo rasgado, escorrendo pela suave descida do caminho enquanto ele ia se levantando lentamente, o sangue pingando de suas presas e garras, a postura desafiadora. O outro lobisomem, tomado de ódio investiu, para desanimo de Allenda. No avan?o descoordenado Uivo apenas utilizou o impulso do atacante e, num movimento leve e maravilhoso, a garra servindo de alavanca dentro do tórax do outro, o lan?ou com grande for?a contra uma rocha exposta onde se espatifou, para os pés da qual escorreu e ficou imóvel, numa postura grotesca.

  Uivo se virou para encarar os outros dois mais próximos. Havia um silêncio pesado nos olhos assassinos que apenas aguardavam.

  Subitamente o anhangá desapareceu, surgindo num estampido seco e quase inaudível ao seu lado. Mas Uivo havia pressentido o movimento. Com um golpe seco e rápido estocou com uma garra, penetrando no cérebro a partir do olho direito. O nefelin tremeu incontrolável e caiu sob o olhar indiferente do estranho puma.

  Uivo o empurrou com a pata, o corpo todo espigado. O impulso foi t?o forte que ele foi lan?ado contra as árvores, além do regato.

  Ent?o ele se virou e encarou o sedenerá. Uma perigosa serenidade transpirava em seus modos.

  Allenda sorriu, se perguntando por que Uivo n?o chamara alguns dos pumas que vira pelo caminho.

  - Talvez esse idiota nem tenha alguém a quem chamar – sorriu novamente.

  O sedenerá se acercou, juntamente com a nefelin manira-ellos que havia se aproximado rapidamente.

  O sedenerá atacou primeiro, os cabelos chicoteando o ar com incrível violência, tornando-se como uma nuvem raivosa e letal. Uivo esquivava e se mexia com extrema velocidade, tentando achar uma brecha para atacá-lo. Por duas vezes Uivo sentiu os cabelos chicoteando seu corpo, arrancando tufos de pelo, cavando dolorosamente na carne.

  Agachado, as garras fincadas no ch?o, Uivo saltou no exato momento em que o sedenerá atacou novamente. Num giro por cima da cabe?a Uivo conseguiu segurar os cabelos. Ao tocar o solo puxou violentamente, trazendo o sedenerá para junto de si. Num pux?o abrupto, acompanhado de um grunhido feroz, arrancou fora a cabeleira viva do sedenerá, que gritou em dor lancinante. Com os olhos atentos à manira-ellos, que estava à sua direita, descreveu com suas garras um círculo no ar, rasgando toda a lateral do pesco?o do sedenerá que, em estertores, despencou de joelhos no ch?o.

  Uivo, indiferente à agonia do inimigo abatido, se voltou para enfrentar a manira-ellos, que disparara quatro flechas em sequência veloz. As setas assoviaram no ar, atingindo alta velocidade no curto espa?o entre eles. Com velocidade estonteante Uivo levantou o sedenerá que ainda agonizava, usando-o para bloquear as duas setas dirigidas para a sua cabe?a. Com total desprezo, para surpresa de Allenda, girou um mínimo o corpo, oferecendo um ombro e a coxa direita, que foram duramente atingidos. Uivo atirou longe o sedenerá e encarou a manira, que disparava mais três flechas. Uivo saltou para uma árvore, e para outra quando a manira disparou mais flechas, e mais outra árvore.

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  Ent?o estacou, os olhos presos nos olhos de Allenda, posicionada tranquilamente sobre a árvore à sua frente, que o olhava indiferente.

  Quase sem se virar o puma desviou uma das setas com sua garra, que fincou o tronco entre os pés de Allenda, enquanto a outra agarrou em pleno ar, estacando seu voo a poucos milímetros de sua cara.

  Com ódio ele virou a cara e encarou a manira, largando a seta que despencou em dire??o ao solo. A manira estava parada, observando-os do ch?o. Ent?o, com tranquilidade ela afrouxou a corda do arco. Tomando as flechas que já estavam posicionadas para novos tiros as guardou na aljava que trazia às costas, enquanto passava o arco pelo pesco?o, ajeitando a corda ao peito.

  Allenda viu o semblante de Uivo se suavizando, observando com respeito a manira.

  Allenda voltou os olhos para a manira a tempo de vê-la curvando levemente o tronco num majestoso cumprimento, que Uivo retribuiu com um grunhido suave, a cabe?a flexionando suavemente. A manira ent?o se virou para ela, o semblante suave e algo curioso. Sem qualquer som ela se virou rapidamente e se afundou na floresta.

  Uivo se voltou novamente para Allenda que, num impulso simples e gracioso, ficou de cócoras no grosso galho musguento.

  Com um movimento calculado Uivo arrancou a flecha do ombro, que partiu e atirou para os pés da árvore, e depois a flecha da coxa, que apenas deixou cair. O sangue surgiu por entre os pelos, pingando nos fios unidos em vermelho.

  Ent?o ele esgar?ou um sorriso.

  - Uma observadora, é o que é? – perguntou numa voz poderosa e um tanto rouca.

  Os longos cabelos de Allenda e os pelos macios do estranho lobisomem se moveram suavemente no ar que se revolvia, como uma campina tocada pelo vento. Um cheiro de terra úmida subiu no ar. Uivo se virou para a distancia, verificando que a chuva n?o chegaria até eles.

  - O que mais deveria ser, puma? – retrucou Allenda com descaso, vendo que os ferimentos estavam sarando rapidamente.

  - N?o te conhe?o para dizer o que você mesma n?o sabe – respondeu secamente.

  - Por que te atacaram, puma?

  - Por que eu deveria te responder isso? – falou, mais que perguntou, saltando para o solo da floresta.

  - Por que te atacaram, puma? – voltou ela a perguntar do alto da árvore. – Por que se deixou atingir pelas flechas? Por que permitiu que a manira se fosse?

  - Quem sabe n?o tenha sido por uma prova do guerreiro? – ele respondeu, se distanciando. – Aquele que me derrotar, ou matar, será considerado grande guerreiro entre eles, ao menos é nisso que acreditam. E, por respeito a eles, permiti que me ferissem.

  - Que idiotice, puma. Quantos já matou?

  - Até agora, desse grupo, acho que uns oito.

  - E você n?o se envergonha de matar curumins? – gritou ela, a pergunta se batendo em ecos pelos troncos.

  - N?o quando me atacam... Você é uma curumim? – desafiou descendo o morro lentamente, a voz morrendo em eco.

  - Talvez algum dia, puma, você saiba... Por enquanto, n?o tenho motivos, e eu n?o preciso provar que sou guerreira.

  - Que bom para você, filha de Adanu.

  - Sou Allenda, e Adanu é apenas meu pai – reclamou ela bem alto.

  - Tudo bem, filha de Adanu, você vai superar isso – falou se despoderando enquanto saia da trilha e entrava pelo meio das árvores.

  - Você n?o é um puma puro... O que você é?

  Allenda ficou esperando, mas resposta n?o veio. Mas isso n?o importava, havia quem lhe diria isso.

  Allenda, do alto da árvore, ficou ainda algum tempo seguindo o homem que surgia de quando em quando pelas frestas de galhos e réstias de luz, tornando-se cada vez menor, até que sumiu além dos morros. Curiosa, ficou cismando, enquanto examinava os corpos dos guerreiros abatidos que come?avam a desaparecer.

  Num impulso saltou e girou, caindo seca no ch?o macio. Assim que ArrancaToco parou ao seu lado, desconfiando que havia mais coisa, partiu discretamente atrás de Uivo, que tomara o rumo da pedra riscada.

  - Aposto que vai procurar aquele humano, que Adanu chama de Tenebe – falou para ArrancaToco, que grunhiu baixinho em resposta.

  Aproveitando-se da despreocupa??o de Uivo, que n?o se mostrava apressado em chegar à Pedra Riscada, porque suas passadas estavam leves e curtas e progredia sobre pés humanos, Allenda ordenou um avan?o mais rápido.

  II

  Allenda sorriu ao ver Uivo ir despontando tranquilamente no alto da montanha. Com um pequeno movimento se ocultou na quina de uma pedra, um sorriso moleque no rosto.

  Assim que o viu, Tenebe o chamou com uma urgência escorrendo pela voz.

  Uivo se aproximou, a estranheza franzindo seu cenho.

  - Sim, Tenebe – Uivo cumprimentou desconfiado.

  Sem qualquer palavra Tenebe o arrastou para a direita. Nem bem haviam chegado até um lugar mais aberto ele parou Uivo com o bra?o, a express?o séria no rosto.

  - Por quê?

  - Por que o que, Tenebe? – desconversou Uivo, mesmo sabendo, pelo semblante do amigo, que ele já estava inteirado do que acontecera, ao menos em parte. – Ou magia ou algum pássaro bisbilhoteiro – cismou com indiferen?a.

  - N?o há nada que queira me dizer?

  - N?o, n?o há nada que queira te dizer, Tenebe – sorriu.

  - Ara, Uivo, vamos parar com isso, está bem? Sei que você atacou o cl? de OrelhaCortada.

  - N?o, é diferente! – reclamou. – Eu matei OrelhaCortada... – falou com simplicidade. - E alguns que se meteram no caminho – acrescentou com tranquilidade.

  Tenebe ficou em silêncio, os olhos examinando Uivo com cuidado.

  Allenda sorriu.

  - Prova do guerreiro, pois sim! – cismou, atenta à conversa que se desenrolava ao longe.

  - E isso foi há quanto tempo?

  - Uns três dias atrás...

  - Era ele o grupo que estava atacando vilarejos lá pelo norte?

  - Ent?o sabe o motivo. Se é assim, Tenebe, por que me parou, por que me interroga?

  - Porque eu acho que você cometeu um grave erro. O cl? dele irá... Eu te avisei e...

  - Eles já vieram atrás de mim, Tenebe...

  Tenebe, estacou. Com o semblante espantado, devagar se sentou numa pedra, os olhos fixos em Uivo.

  - Entendo... E se sente melhor, Uivo?

  - Bem melhor – confessou.

  - O defensor dos fracos – Tenebe riu com sarcasmo. - Quando vai aprender que você n?o é o justiceiro, que n?o cabe a você...

  - Quanto a isso você está enganado. Qualquer um que esteja vivo é responsável pelos outros.

  - E por isso mata?

  - Se for necessário, sim! – declarou com tranquilidade.

  - Sei, sei... Confesso que seu senso de justi?a é admirável, apesar de saber que ainda vai te colocar..., nos colocar em vários apuros – se corrigiu, a voz meio alarmada. - Ent?o vá lá, me conte o que aconteceu.

  - Esque?a isso - pediu. - Olhe Tenebe, sei que se preocupa comigo, e te agrade?o por isso, como sei que, no fundo, se sente feliz pelo que aconteceu.

  - Isso n?o importa – Tenebe interrompeu. – Me conte.

  Uivo olhou para o velho. Apesar de achar que n?o devia explica??es desse seu ato, viu que n?o seria deixado em paz, e que sua recusa iria deixar o feiticeiro ainda mais irritado, no que até gostou de pensar. Mas resolveu contar, porque queria um pouco de sossego.

  - Está bem, está bem! – capitulou sentando-se ao seu lado. - Eu fiquei sabendo que o cl? estava para atacar mais uma daquelas aldeias pequenas do norte. Ent?o fui para lá, só isso.

  - Continue, Uivo.

  - Que coisa, héim? – reclamou. – Bem, acontece que eu cheguei no momento em que eles estavam se preparando para atacar a aldeia. Ent?o entrei pelo meio deles e..., matei OrelhaCortada.

  - Assim, sem mais nem menos? – espantou-se Tenebe.

  - Eu o mandei parar e se retirar. Como n?o o fez, o matei.

  - E os outros?

  - Ficaram como loucos. Eu saltei e fugi... – revelou com simplicidade.

  Tenebe olhou fundo em seus olhos, e sorriu.

  - Sei... Quantos matou nessa sua... fuga?

  - Acho que uns seis... Eles deviam estar cansados e...

  - Em algumas ocasi?es a humildade é para tolos. Sei que está orgulhoso de você mesmo, do que fez, o que é um erro, um erro muito perigoso. Continue!

  - é verdade, pai. Só isso, eu fugi...

  - Eles foram atrás de você... – ajudou.

  - Sim, cinco deles. E foi logo agora.

  - Agora? – Tenebe o olhou espantando. – Você quer dizer, agora? Agora?

  - Sim... Foi há coisa de uma hora, eu acho...

  - Ai, pelo Trov?o. E?

  - Matei quatro...

  - Pelo Trov?o – reclamou. - Qual deles deixou escapar?

  - A manira-ellos...

  - Ah, sei... Por quê? Por que era bonita?

  - Sim, claro que era bonita, mas n?o foi por isso.

  - Sei... Por que ent?o?

  - Por que ela era a única guerreira dentre eles.

  Tenebe ficou novamente em silêncio, cismando.

  - OrelhaCortada era um senhor da guerra. Ele...

  - Ele era, n?o é mais.

  Tenebe voltou a ficar novamente pensativo, os olhos postos em Uivo, que estava tranquilo e em paz. Ele n?o se justificava, n?o se explicava; estava apenas conversando. N?o teve como n?o sorrir.

  - Sabe, filho, por mais nobres que sejam nossos atos, alguns podem se desdobrar no futuro, e atingir muitos outros.

  - N?o fazer nada, também pode cauar desdobramentos, n?o é mesmo?

  Tenebe n?o teve como n?o sorrir.

  - N?o acha que Danbara poderá te atingir? No futuro?

  - N?o! Além de n?o ser próprio dos ellos, eu vi nobreza nela. Ela é uma guerreira de valor. Quando eu entrei pelo meio do grupo ela discutia com OrelhaCortada, se recusando a participar daquele ataque.

  - Ela poderia ter ido contra o grupo, mas n?o um estranho como você. Você sabe o código... O grupo tinha precedência.

  - Tenebe, eu já tinha ouvido falar desse grupo, e em duas aldeias que haviam sido atacadas antes eu soube dela, dessa manira-ellos. Ela era um dos poucos do cl? que atacava somente guerreiros, e se esfor?ava muito em conter os excessos.

  - Sei, realmente parece uma guerreira com código de honra. Mas, mesmo assim eu tenho receio por você...

  - Use sua magia para ver, Tenebe. Quando a deixei ir, ela me cumprimentou de forma honrada.

  - Sabe o nome dela, Uivo?

  - Sim, o nome dela é Danbara.

  - Por Tup?... – exclamou Tenebe, os olhos abertos, a voz engasgada.

  - Ent?o você já ouviu falar dela...

  - Sim, e muito. é uma guerreira formidável, admirável...

  - Ent?o, ainda bem, n?o é mesmo? – exclamou satisfeito. - Agora ela está livre para dominar aquele cl? – sorriu.

  - Por um acaso, a irm? dela, Jádina, n?o estava no meio dos que você matou, n?o é mesmo? – perguntou, a voz mostrando claramente a preocupa??o que havia tomado o velho feiticeiro.

  - N?o, claro que n?o. Eu já a vira, e a marcara. Eu n?o a atacaria, em respeito à Danbara. A irm?, provavelmente orientada por Danbara, se afastara do cl? com muitos outros, se recusando a participar do ataque. Na verdade, Tenebe, tenho certeza de que o cl? estava rachando.

  - Provavelmente sim... Bem, devo confessar que, apesar de ter sido temerária sua atitude, as coisas v?o se ajeitar muito bem. Danbara é uma guerreira muito temida, e com uma nobreza incrível. N?o vou dizer que estou feliz, mas digo que estou satisfeito – sorriu por fim. – Pelo cl? de... Danbara e por você...

  Como se estivesse cansado Tenebe se levantou devagar e pesado, as m?os sobre os ombros do jovem.

  - N?o sabemos a inten??o de Danbara, Uivo... Deve ter cuidado, até saber como Danbara..., e Jádina, reagir?o.

  - Está bem, está bem... Vou tomar cuidado...

  Tenebe ent?o tirou as m?os, um sorriso se formando no rosto.

  - Deve ter cuidado, pumacaya – sussurrou falando mais perto. – Você está sendo observado.

  Uivo se virou rapidamente, os sentidos em alerta, enquanto o velho feiticeiro o observava com aten??o.

  Ent?o um movimento, alguns pedregulhos rolando dos pés de uma grande rocha. Uivo cheirou o ar e ficou observando as sombras, confuso sobre quem poderia ser.

  - Ah, que pena. Já foi embora. Mas, fique tranquilo, n?o foi Danbara – Tenebe sorriu novamente.

  - Quem ent?o?

  – Isso n?o importa, teimoso.

  De súbito apontou para o ombro de Uivo, mostrando uma certa alegria, dessas que se tem quando se desmascara alguém.

  - Ah, viu só? Ferimentos... – falou, examinando o ferimento de flecha. – Ainda bem que n?o estava envenenada e...

  - N?o estava n?o. Senti o cheiro dela ainda no ar e...

  - E também na perna... Mais algum ferimento, além da seta de Allenda de ontem, e das flechas e cortes de... sedenerá? – perguntou reconhecendo os cortes finos e um pouco esgar?ados.

  - Esque?a isso – pediu Uivo se desvencilhando com cuidado de Tenebe.

  - Esquecer... Tá bom... – resmungou.

  Tenebe estranhou quando notou que as fei??es de Uivo se modificaram. Confuso se virou, vendo que Adanu se aproximava em companhia de sua filha.

  Ent?o se virou para Uivo, mas viu que ele se afastava com passos duros e rápidos.

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