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Prólogo: O Dia em que o Tempo Parou

  A For?a do Tempo é conhecida por muitos como a for?a-tarefa que salvou a humanidade em diversas ocasi?es – um grupo de indivíduos altamente treinados com a capacidade de se transformar, quase que instantaneamente, em guerreiros poderosos. Eles eram encarregados de lidar com qualquer amea?a à linha do tempo para preservar um futuro adequado para todos. Essa é a história que todos já conhecem, mas a narrativa que ninguém conhece – e que ainda n?o foi contada – é muito mais complexa do que isso. Neste universo, a For?a do Tempo já n?o existe mais. Alex Drake e Jen Scotts nunca chegaram ao comando. Alguém — ou algo — mudou o curso dos eventos muito antes disso.

  O ano era 2985, e o que parecia ser mais um dia de trabalho comum no Centro de Comando da For?a do Tempo foi o início de um desastre quase irreparável na linha do tempo. Era a verdadeira calmaria antes da tempestade. Um estrondo muito alto p?de ser ouvido, vindo do setor de triagem, localizado no lado oeste da base. Esse setor era responsável pelos processos de coleta de dados dos criminosos antes de enviá-los para a pris?o criogênica.

  Um alerta foi emitido pelo general responsável pelo setor e rapidamente se espalhou por todos os corredores da base, por meio dos alto-falantes, em comunicados oficiais. O horror tomou conta dos semblantes dos tripulantes quando, na tela do sal?o de conferência, foi exibido o estado atual do Centro de Comando. Já n?o existiam mais o lado oeste nem a ala sul da base; o que antes lá havia agora estava tomado por cinzas, escombros e pilhas de corpos – tanto de detentos quanto de oficiais.

  No laboratório de bordo, onde eram conduzidas pesquisas e aprimoramentos de combate, um velho senhor conversava em um tom sereno, tentando acalmar uma pequena crian?a de cabelos verdes, visivelmente assustada. Ele segurava as m?os da crian?a enquanto se ajoelhava e dizia:

  — Acalme-se, crian?a. Vai ficar tudo bem, eu prometo. — disse o senhor, enxugando as lágrimas do rosto dela. — Agora, você precisa seguir até a saída de emergência da ala norte. Você consegue chegar lá, n?o consegue?

  — Professor, eu n?o quero ir sozinho. O senhor precisa vir comigo!

  — Eu entendo sua preocupa??o, jovem, mas isso n?o faz parte dos meus deveres como pesquisador aqui. — O velho senhor alcan?ou o que parecia ser um protótipo inacabado de um bracelete. — Leve isto com você. Agora eu entendo... minha verdadeira miss?o sempre foi garantir a sua seguran?a.

  A crian?a segurou o protótipo com for?a contra o peito e saiu correndo entre solu?os e trope?os, rumo à saída que já conhecia. Gritos ecoavam pelos corredores da base, e o menino sentia os horrores do que estava acontecendo como se estivessem sendo infligidos diretamente em sua própria pele.

  Quando já estava próximo da saída, viu outro garoto, quase da mesma idade, caído no ch?o — sem vida. A vis?o o aterrorizou instantaneamente, paralisando-o por completo, incapaz de mover um único músculo.

  Ele permaneceu ali, à distancia, por vários minutos, observando o corpo frio e sem vida do rapaz de cabelos loiros, até que ouviu uma voz vindo à sua frente.

  — Garoto! — Era uma mo?a usando a farda da For?a do Tempo. — Venha, rápido!

  O menino sentiu um inesperado conforto na voz da mulher. Aquilo foi suficiente para fazê-lo se mover novamente. Ele conseguiu seguir em frente — e, finalmente, escapou da base.

  Após se afastarem do Centro de Comando, já em colapso, os sobreviventes sentiram o ch?o tremer — uma sequência de explos?es violentas destruiu por completo o que restava da base. A mulher rapidamente usou o próprio corpo para proteger o garoto, envolvendo-o com os bra?os. O menino permaneceu com os olhos fechados até o som das explos?es cessar.

  — Mo?a… a gente já pode sair daqui? — ele perguntou, sem obter resposta. — Mo?a!?

  Foi ent?o que ele percebeu que a mulher que havia salvado sua vida momentos antes já n?o estava mais viva — um dos destro?os da explos?o havia atingido sua cabe?a em cheio. Ali mesmo, ele se deu conta de que n?o tinha mais um lugar para chamar de lar. Desde muito cedo, o Centro de Comando havia sido tudo o que conhecera.

  Ainda desnorteado, lan?ou um último olhar para o corpo da mulher estendido no ch?o e notou um broche em forma de coruja preso à manga da farda. Com m?os trêmulas, pegou o broche e o guardou consigo — n?o apenas como lembran?a daquela mulher que nem sequer conhecia, mas como um símbolo da memória de todas as vítimas do evento catastrófico daquele dia.

  Mais tarde, naquele mesmo dia, após andar incessantemente em dire??o à cidade mais próxima, Trip se viu cansado e desidratado no meio do caminho. Foi só ent?o que a exaust?o o venceu por completo. Seus olhos se fecharam, e o mundo se apagou.

  Quando abriu os olhos novamente, a primeira coisa que enxergou foi uma paisagem linda do lado de fora da janela do quarto onde aparentava estar. Levantou-se com dificuldade e bebeu um copo d’água que estava sobre uma mesa, no ambiente que parecia ter sido preparado especialmente para ele.

  Ele caminhou até a porta, mas, antes de sair, escutou vozes do outro lado. Com medo de que tudo aquilo fosse uma armadilha — pois tudo parecia bom demais para ser verdade —, decidiu sair pela janela do quarto. Correu em dire??o ao horizonte da paisagem, apenas para descobrir que uma espécie de parede invisível o prendia naquele espa?o, onde só havia uma casa simples e um belo jardim.

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  Ao bater de frente com a barreira invisível, caiu no ch?o com o nariz sangrando. Ainda atordoado, ouviu uma voz atrás de si:

  — Olá, Trip.

  Ele se virou para encarar a figura e viu um homem com quase dois metros de altura, cabelos da cor do sol, olhos amarelos reluzentes e um rosto no qual a única coisa visível eram os olhos e um cristal — exatamente como o que Trip tinha na própria testa. Todo o restante do rosto, como boca e nariz, estava oculto, como se uma sombra constante o envolvesse.

  — Eu sou Vyre, um Xybriano... assim como você — disse a figura enigmática com uma voz serena, quase etérea.

  Trip estreitou os olhos, instintivamente dando um passo para trás.

  — Por que eu n?o consigo ver o seu rosto? — perguntou, sua voz carregada de desconfian?a.

  — Porque eu n?o quero que você veja — respondeu Vyre, se ajoelhando lentamente para ficar na altura do garoto. Havia gentileza no gesto, mas algo enigmático em sua presen?a. — Nós, Xybrianos, temos certas habilidades... dons que se manifestam de formas diferentes em cada um de nós. Neste momento, estou dentro da sua mente. é isso que impede você de enxergar meu rosto por completo. E acredite... é melhor assim.

  Trip hesitou por um instante antes de insistir:

  — Por que é melhor assim?

  Vyre abaixou a cabe?a por um momento, como se pesasse suas palavras.

  — Porque há muito tempo, travei uma batalha. Uma que me deixou cicatrizes profundas — disse, levando a m?o ao rosto coberto pela sombra. — Fui desfigurado... mas também despertei um potencial que nunca imaginei carregar. E paguei um pre?o alto por isso.

  Houve silêncio. Trip observava cada detalhe — o brilho quase hipnótico do cristal na testa de Vyre, os olhos intensos que pareciam atravessá-lo por dentro. Ele se levantou, sentindo uma inquieta??o no peito.

  — Onde eu estou? Como vim parar aqui?

  — Você está em um lugar seguro. E, mais importante... está onde precisava estar — disse Vyre com firmeza, levantando-se também. — Há coisas neste universo que nem mesmo os seres mais sábios conseguem entender. Mas há instantes em que o destino fala. E eu ouvi.

  — Ouviu o quê?

  — Um pedido de socorro. Um grito que atravessou a vastid?o. Era seu. Mesmo inconsciente, você conseguiu me alcan?ar... uma fa?anha rara para alguém da sua idade. Isso significa algo, Trip. Algo maior do que você imagina.

  Trip engoliu seco. A dor do que havia perdido ainda pulsava em sua memória, mas pela primeira vez depois do incidente, ele sentiu algo diferente. Um fio tênue de esperan?a.

  Em silêncio, Vyre estendeu a m?o para Trip e o guiou até a casa — uma constru??o simples à primeira vista, mas com detalhes e tecnologia que a tornavam surpreendentemente moderna.

  Na varanda, sentada sobre o corrim?o com as pernas balan?ando, estava uma menina de cabelos rosa vibrantes e um cristal reluzente na testa.

  — Trip, esta é Nyli — anunciou Vyre, com um gesto elegante. — Minha escudeira dedicada, minha aprendiz mais engenhosa e, claro, também uma Xybriana como nós. Ela apareceu na porta da minha humilde residência há cinco anos... e desde ent?o, nunca mais deixou de surpreender.

  Nyli saltou da varanda com a leveza de quem já estava acostumada a impressionar, e abriu um largo sorriso ao se aproximar.

  — Muito prazer! Fui eu que construí tudo isso aqui, sabia? — disse com orgulho, tirando do bolso do macac?o jeans uma ferramenta de aparência exótica. — Inclusive, fui eu quem inventou essa belezinha. Com ela, consigo montar praticamente qualquer coisa.

  — E n?o é exagero — completou Vyre, com um tom quase paternal. — Desde sistemas de defesa até aquela barreira invisível na qual você deu de cara mais cedo… tudo passou pelas m?os dessa pequena gênia.

  Trip estendeu a m?o para cumprimentar Nyli com uma formalidade tímida, mas ela simplesmente sorriu e o abra?ou com carinho. O gesto o pegou de surpresa. Ele ficou parado, sem saber como reagir e visivelmente sem jeito.

  — Escute, Trip — disse Vyre, com o tom sereno de quem fala com o cora??o — Eu n?o posso obrigar você a ficar. O que posso fazer é ser honesto. Se você decidir partir, encontrará um mundo lá fora que n?o vai ter compaix?o. Ele vai testar seus limites, vai empurrá-lo para o ch?o e fazer você acreditar que levantar é impossível. E, muitas vezes, parecerá mesmo que é.

  Ele fez uma pausa longa, o olhar agora mais intenso.

  — Mas se decidir ficar... aqui, você terá um lar. Terá a chance de crescer, de se descobrir, de transformar sua dor em propósito. Aqui, você n?o vai estar sozinho. Eu e Nyli seremos sua família. E com esfor?o, disciplina e coragem, eu vou ensinar vocês a se tornarem mais do que apenas sobreviventes... Vou moldar os dois para que sejam os Xybrianos mais engenhosos, habilidosos e extraordinários que este mundo — e qualquer outro — já viu.

  Vyre estendeu a m?o para ele uma última vez.

  — A escolha é sua. Mas seja qual for, que ela venha do cora??o.

  Trip lan?ou mais um olhar demorado para o horizonte além daquele refúgio escondido. O céu distante parecia chamá-lo, mas n?o com promessas — e sim com incertezas. Com as m?os trêmulas, ele enfiou os dedos no bolso e retirou o broche em forma de coruja.

  Ficou ali, parado, observando o pequeno objeto com olhos vidrados. O silêncio ao redor era quase sagrado. Durante alguns minutos, ele apenas encarou o broche, como se pudesse encontrar respostas dentro dele. E ent?o, como se um dique tivesse se rompido, as lágrimas come?aram a cair. E n?o pararam.

  Uma avalanche de lembran?as o atingiu com for?a. O peito de Trip se apertou num nó impossível de desatar. Ele apertou o broche contra o peito com tanta for?a que os dedos ficaram brancos. O choro se transformou em solu?os, até que, finalmente, ele gritou — com a voz embargada e o cora??o escancarado:

  — Eu quero ficar! Por favor... me deixem ficar!

  Com o broche apertado contra o peito e o peso das memórias ainda fresco nos olhos, Trip escolheu ficar. N?o para apagar o passado, mas para honrá-lo — construindo, ali, o primeiro passo de um novo futuro.

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